No curso de 2019, a área trabalhista viveu verdadeiro frisson diante de variadas notícias a respeito do reconhecimento, pela Justiça do Trabalho, de vínculo de emprego entre motoristas e a Uber do Brasil Tecnologia Ltda..

Logo no início do ano, virou notícia a sentença prolatada pela i. magistrada da 37ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte (MG) que reconheceu o vínculo de emprego e determinou o registro da CTPS do reclamante. A decisão sequer foi submetida à apreciação em segundo grau uma vez que as partes celebraram acordo, colocando fim ao litígio¹.

Meses depois, ainda no âmbito do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, a 11ª Turma decidiu – por maioria – reformar uma decisão de 1º grau para reconhecer a existência de vínculo entre o autor e a citada empresa, determinando o retorno dos autos à origem para apreciação dos demais pedidos contidos na exordial².

Necessário registrar que, em seu voto, a i. relatora fez referência expressa aos fundamentos utilizados, pouco tempo antes, pela 15ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região³ que também havia determinado a reforma da sentença, reconhecendo o vínculo empregatício entre o reclamante motorista e a Uber.

Contudo, em sessão realizada no último dia 5, a 5ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho entendeu pela reforma do indigitado Acórdão, tendo sido a primeira oportunidade em que a mais alta corte trabalhista do país se manifestou sobre o tema.

No entendimento dos i. Ministros, a autonomia do motorista no desempenho de suas atividades descaracteriza a subordinação, elemento essencial para o reconhecimento do vínculo postulado.

Ademais, os julgadores levaram em consideração o fato de que o motorista fica com 75% a 80% do valor pago pelo usuário, importe superior ao admitido como bastante para a caracterização da relação de parceria entre os envolvidos, o que não seria condizente com a relação de emprego, conforme noticiado no sítio eletrônico do Tribunal⁴.

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Com todas as vênias às poucas opiniões dissonantes, andou bem a 5ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho diante da patente autonomia conferida aos motoristas de aplicativos que, como sabido, podem se ativar conforme suas conveniências pessoais, não sendo raro o caso de motoristas eventuais que se utilizam da plataforma de tecnologia como forma de complementação de renda.

Ora, a existência de regras de conduta, como a possibilidade de exclusão do motorista que tiver elevada taxa de cancelamento de viagens, não se apresenta como elemento caracterizador da subordinação exigida para reconhecimento do vínculo empregatício.

Por óbvio, o fenômeno em comento, já conhecido como “uberização” tem assombrado o mercado de trabalho formal e resulta em questão econômica e social relevante, com a expansão do modelo para outras plataformas, com especial realce para a relacionada à entrega de refeições.

Em momentos de crise econômica, como a vivenciada no Brasil recente, vozes apocalípticas evocam o Judiciário a se insurgir contra o modelo que encarnaria a total precarização das relações de trabalho.

Contudo, como sabem os estudantes dos primeiros períodos das faculdades de Direito, o Poder Judiciário carece de legitimidade democrática para regular a questão, devendo evitar o ativismo judicial que, como sabido, atua ao sabor dos ventos, causando profunda insegurança jurídica.

Desta feita, não há reparos a se fazer quanto à decisão do Tribunal Superior do Trabalho que aplicou, de forma escorreita, a legislação de regência e os princípios norteadores do Direito do Trabalho.

Não se nega a necessidade de o tema ser regulado – o que constitucionalmente compete ao Poder Legislativo e historicamente decorre da correlação de forças políticas e sociais do país, em especial da organização dos trabalhadores envolvidos na atividade em debate.

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[1] Processo nº 0010635-18.2017.5.03.0137

[2] Processo nº 0010806-62.2017.5.03.0011

[3] Processos nº 1000123-89.2017.5.02.0038

[4] Disponível em: http://www.tst.jus.br/web/guest/noticias/-/asset_publisher/89Dk/content/id/25103977